A Sagrada Escritura é essa espécie de “tesouro donde um pai de família sabe tirar coisas novas e velhas” (Mt 13, 52). Que sabedoria! Que abertura de horizontes! Que retrato da vida pessoal e coletiva!
Verdadeiro tesouro é a parábola do rico hedonista e do pobre Lázaro. Sob o ponto de vista da lei do Estado, o primeiro nada fez de mal: nem bateu em Lázaro, nem o difamou, nem lhe atiçou os cães. Nada! Não obstante, a nossa consciência fica chocada com o seu proceder. E o Senhor Jesus diz que o lugar dele é… no inferno.
Porquê? Porque, para se ser pessoa, não chega o não fazer mal: positivamente, é preciso fazer o bem. Qual? Na parábola, indicam-se as duas vias da humanização: a espiritualidade ou atitude de quem caminha na vida na direção do horizonte de Deus; e a justiça, essa preocupação de quem não suporta relações sociais enviesadas, mas fraternas e responsáveis.
Sim, é-se pessoa quando não se caminha na vida curvado para a terra, com os olhos colados ao chão, sob a ditadura das coisas pequenas: o significado da existência reside no que está acima de nós e não no que pisamos com os pés. Mas, para ser pessoa, também há que acreditar e lutar por uma sociedade de semelhantes, fraterna. E isso é a justiça.
Para a sua implementação, há que erradicar o hedonismo, pois este distrai a atenção do essencial. Há que denunciar que o individualismo leva a fechar os olhos e impede de ver a miséria alheia: porque endurece o coração, torna-o insensível aos frágeis. E há que alertar que o materialismo das pessoas facilmente se transfere para as mentalidades dos povos e gera as piores injustiças: a insensibilidade social, as desigualdades gritantes, o neocolonialismo, a exploração desenfreada dos recursos naturais e mesmo das nações mais pobres.
Na Bíblia, há um símbolo que corporiza estes males: o bezerro de ouro. Não existe ídolo mais sanguinário que ele: impede o acesso a Deus e aos irmãos e tende a alimentar-se do sangue destes. Como pode um discípulo de Cristo adorá-lo? Quem sacrifica a esse vitelo entra em ruína porque não se cumpre na sua vocação histórica e eterna.
***