Apesar da sua população de cerca de trinta milhões de habitantes e da sua enorme superfície, o Iémen é geralmente considerado como o mais pobre dos estados árabes da região do Golfo Pérsico. Certamente por isso, e por razões históricas específicas, trata-se de um país que durante muitos anos nunca motivou um interesse muito particular e continuado da opinião pública internacional, embora dizer “nunca” seja certamente um exagero.
Por António José da Silva
O papa Francisco, por exemplo, na sua última Mensagem de Natal, fez uma referência particular à situação que se vive naquele país, vítima de uma crise humanitária que atinge milhões de pessoas, sobretudo crianças.
O pretexto para essa mudança de comportamento da Comunicação Social foi uma tragédia que ocorreu há uns meses atrás e que vitimou dezenas de crianças que viajavam num autocarro a caminho da escola. O autocarro parou junto de um mercado para os jovens se abastecerem de água, e nesse espaço de tempo foi bombardeado por um ou mais aviões da coligação militar que apoia o governo de Riad, numa guerra civil que já fez milhares de vítimas. A morte dessas dezenas de crianças parece ter acordado a opinião pública internacional para as consequências humanitárias de uma guerra aparentemente esquecida.
Há dias, no entanto, o conflito assumiu contornos surpreendentes, por via de um ataque devastador lançado contra a mais famosa empresa petrolífera da Arábia Saudita e do Mundo, a Aramco Foi um golpe que, além dos seu efeitos profundamente negativos para a economia do país com a queda dramática da produção e exportação do chamado ouro negro, veio revigorar o ânimo dos grupos que combatem o regime e que são liderados pelos “huties”.
Trata-se um movimento de cariz regional e étnico, que tem como característica identificadora a sua ligação ao xiismo, um ramo do Islão que se opõe à corrente sunita, claramente maioritária na península arábica.
Esta relação com os dois grandes ramos do islamismo deu ao conflito uma dimensão perigosamente alargada com a formação de alianças que dividem o mundo islâmico e o Médio Oriente É certo que os huties constituem uma minoria, mas uma minoria significativa de cerca quatro milhões de fiéis que, na sua luta contra o sunismo, são apoiados abertamente pelo Irão, um país que, por coincidência, tem em Moscovo o seu mais poderoso aliado.
Já o governo saudita, além do apoio da maioria dos estados do Golfo, conta ainda com a ajuda militar norte-americana. Estão pois criadas as condições para que uma guerra civil localizada se possa transformar num perigoso conflito regional.