Editorial: A responsabilidade no exercício da soberania

Aproxima-se a celebração das eleições legislativas, marcadas para 6 de outubro de 2019. Uma data de dia seguinte, já que a implantação da República pode sugerir outra coisa mais importante: o triunfo da democracia. Nas sociedades da Europa as estruturas democráticas são compatíveis com a prevalência da monarquia, como é o caso de sociedades desenvolvidas, como a inglesa, a belga, a holandesa, a sueca, a norueguesa, a dinamarquesa e a espanhola, que são monarquias constitucionais e democracias avançadas, e algumas modelos de desenvolvimento humano e social harmónico.

Por M. Correia Fernandes

E realização de eleições caracteriza o exercício da democracia, mesmo que saibamos que não é nem o seu centro nem a dimensão mais importante. O centro do exercício democrático é a participação dos cidadãos nas decisões coletivas e a dimensão mais importante é a capacidade de opinião e intervenção nas decisões das coletividades. O sujeito da autoridade política é o povo considerado na sua totalidade como detentor da soberania, como afirma a Doutrina Social da Igreja.

O exercício da ação eleitoral implica uma dupla dimensão e uma dupla responsabilidade: a participação dos cidadãos eleitores e a responsabilidade dos cidadãos eleitos como representantes da vontade dos eleitores. Habitualmente coloca-se o acento no dever de votar por parte dos leitores, e esquece-se o dever do exercício do poder que lhe é deputado por estes para um exercício dinâmico e equilibrado em ordem ao bem comum.

Aqui reside frequentemente a raiz do desinteresse dos cidadãos eleitores: a verificação de que o exercício da representatividade se transforma em lutas políticas, em confrontos e agressões verbais e muitas vezes em decisões interesseiras.

Uma análise do sistema partidário e das fórmulas de representatividade engendra também motivos de desconforto, sobretudo em torno de duas componentes: a representatividade e a proporcionalidade. No sistema português a representação está entregue aos partidos políticos, sem admissão de outras formas de expressão da vontade popular. Têm-se desenhado propostas que visam a chamada aproximação dos eleitos aos seus eleitores, através de esquemas que se têm revelado falíveis. Assim os representantes da população são pessoas escolhidas pelos partidos, segundo o grau de predominância que assumem na estrutura partidária.

Outro aspeto essencial é o valor e a consistência das propostas políticas. Estas são influenciadas e mesmo dirigidas por critérios ideológicos, ordenados em conceitos cujo sentido se vai diluindo ou perdendo, como os de direita e de esquerda, que correspondem mais a grupos que a propostas de transformação. Todas as propostas se autovalorizam como expressão do interesse da população.

De todo este universo de situações, importa que o cidadão tenha como orientação pessoal um conjunto de valores que o possam nortear. Neste sentido a Doutrina Social da Igreja fornece orientações dinâmicas não apenas para os cristãos, mas para toda a sociedade humana.

Recordemos algumas delas:

1.A autoridade política deve garantir a vida ordenada e reta da comunidade, para a realização do bem comum.

2.A autoridade política é o instrumento de coordenação para o crescimento humano integral.

3.O exercício da autoridade política deve ter em vista o bem comum.

  1. O sistema da democracia consente e garante uma melhor realização do direitos.

5.A autoridade deve deixar-se guiar pela lei moral, traduzindo-se em ações concretas para alcançar o bem comum.

6.A autoridade deve reconhecer, respeitar e promover os valores humanos e morais essenciais.

Estes são princípios orientadores de escolhas. Perfila-se um número elevado de partidos que se sujeitam à escolha do eleitorado, ao todo 21. Esta deve mais por princípios que por pessoas. Mas esta é uma distinção difícil de discernir. Há que usar a mente esclarecida e uma procurada lucidez de espírito.