Corpo de Deus. Bispo do Porto: “se soubermos receber, saberemos dar”

Estiveram milhares de fiéis na Procissão do Corpo de Deus. Num dia dedicado ao culto eucarístico, percorrido pela oração, a adoração e a procissão do Corpo de Deus, D. Manuel Linda lembrou ser necessário desenvolver uma cultura do acolhimento, apelou para a defesa do domingo como dia da família e assinalou o seu desejo de inaugurar em breve, na cidade do Porto, um espaço que tenha o Santíssimo Sacramento exposto durante todo o dia.

texto e fotos Rui Saraiva

Na Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo, dia 20 de junho, teve lugar na cidade do Porto a tradicional Procissão do Corpo de Deus. Numa organização do Cabido Portucalense a que se associam as paróquias, as ordens terceiras, as confrarias, movimentos e instituições da cidade, o Santíssimo Sacramento da Eucaristia foi levado em procissão. É um momento que se repete na cidade do Porto desde 1417. Desta vez, foram milhares os fiéis que participaram num intenso momento de testemunho cristão.

Recordemos que a Solenidade do Corpo e do Sangue de Cristo foi instituída em meados do século XIII, numa época em que se comungava muito pouco e onde se levantavam dúvidas sobre a presença real de Jesus na hóstia consagrada depois da celebração da Eucaristia. Foi por isso que nasceram as procissões eucarísticas pelas ruas das cidades.

Deus coloca-se nas nossas mãos

A Festa do Corpo de Deus na cidade do Porto começou logo pela manhã com a Eucaristia na Igreja da Santíssimo Trindade, presidida por D. Manuel Linda, bispo do Porto. Concelebraram D. Armando Domingues, bispo auxiliar do Porto e D. Gilberto Canavarro, bispo emérito de Setúbal. Presentes muitos sacerdotes e diáconos. A animação litúrgica esteve a cargo do Coro do Seminário Maior do Porto, sob a direção do padre Vasco Soeiro, acompanhado ao órgão por Gregório Gomes.

Tomando como estímulo de reflexão as leituras do dia, o bispo do Porto começou por afirmar na sua homilia que “em cada Eucaristia celebra-se o Mistério da Fé” e assinalou o texto de S. Paulo que recorda as palavras de Jesus aos discípulos: “fazei isto em memória de mim”. Nesta passagem verificamos que “é Deus que nos procura” e que se “coloca nas nossas mãos” – disse D. Manuel Linda.

Por sua vez – assinalou o bispo do Porto – o Evangelho de S. Lucas, lembra, neste dia, o milagre de Jesus que sacia a multidão ao multiplicar os pães e os peixes e dizendo aos seus discípulos “dai-lhes vós mesmos de comer”.

Para D. Manuel Linda, estas leituras devem levar-nos a concretizar na nossa vida as palavras de Jesus. Em particular, o bispo do Porto recordou recentes dados que apontam para a existência no norte de Portugal de mais de 600 mil pessoas desempregadas, sendo que 200 mil correm o risco de caírem na pobreza. “Estamos a caminhar para uma civilização fraterna?” – perguntou D. Manuel em forma de pista de reflexão.

O bispo do Porto, na sua homilia, levantou a sua voz para com a possibilidade do jovem doutorando em Matemática, Miguel Duarte, poder vir a ser processado em Itália por ajuda à imigração ilegal. Recordando este caso mediático das últimas semanas, D. Manuel Linda afirmou que a consciência cristã se deve “revoltar” perante esta situação, pois, Miguel Duarte apenas tentou salvar migrantes que corriam risco de vida no mar Mediterrâneo.

Receber a Eucaristia para saber dar

No final da Eucaristia foi exposto o Santíssimo Sacramento para a Adoração dos fiéis. Pelas 16 horas foi tempo de Vésperas Solenes num Igreja da Santíssima Trindade repleta de fiéis. De seguida, a Procissão Eucarística percorreu a Avenida dos Aliados, a Praça da Liberdade, a Praça Almeida Garrett e subiu depois a Avenida D. Afonso Henriques em direção ao Terreiro da Sé. Presentes autoridades civis e militares. O percurso foi animado pelo Coro do Seminário Maior do Porto e também pela Banda Marcial da Foz do Douro. A Procissão concluiu-se com a Bênção do Santíssimo Sacramento.

Na sua alocução, o bispo do Porto, apelou para uma “cultura do acolhimento”. Sublinhando o problema despoletado pela possível acusação em Itália ao jovem português, Miguel Duarte, por ter ajudado migrantes no Mediterrâneo, D. Manuel Linda, acentuou as suas palavras proferidas na homilia da Eucaristia matinal, declarando a sua rejeição a tal situação. E comentou: “Pelos vistos, agora, é crime ajudar quem está à beira da morte”.

Por outro lado, o bispo do Porto, assinalou ser muito importante valorizar o domingo como “dia do Senhor e dia da família”. “Numa cultura de turnos” – disse D. Manuel – corre-se o risco de que uma família ter no espaço de “dois meses” só “um fim-de-semana para passarem juntos” – afirmou.

Dirigindo a sua atenção para a cidade do Porto, incluindo também nas suas palavras a cidade de Gaia, considerando serem ambas um só espaço urbano que o rio Douro une, D. Manuel Linda apontou dois caminhos que devem ser valorizados: o culto mariano e o culto eucarístico.

O bispo do Porto frisou a necessidade de ser valorizada “Nossa Senhora como modelo de ser crente” na vida das comunidades e recordou que existe na diocese, precisamente em Gaia, o Santuário do Monte da Virgem, nesta que é a “cidade da Virgem” – assinalou.

Em relação ao culto eucarístico, D. Manuel Linda declarou o seu desejo de no ano 2019-2020 ser inaugurado um espaço na cidade do Porto que tenha durante todo o dia o Santíssimo Sacramento exposto, para que os fiéis possam ir aí dizer “o seu recado ao nosso Deus” – afirmou.

O bispo do Porto deseja “uma cidade do encontro” que saiba caminhar com o “exemplo de Maria, Nossa Senhora” e que seja mais eucarística “porque a Eucaristia é sempre o tomai e comei este é o meu Corpo” – assinalou.

“Esta dádiva que chega até nós é para ser levada depois aos outros. Se soubermos receber saberemos dar” – disse D. Manuel Linda no final da sua intervenção na conclusão da Procissão do Corpo de Deus.