Editorial: A Igreja e as questões de género

A Congregação para a Educação Católica tornou público, recentemente, um documento sobre as questões de género. Tem por título “Homem e mulher os criou.

Por Jorge Teixeira da Cunha

Para uma via de diálogo sobre a questão do gender em educação” e tem a data de 2 de Fevereiro do corrente ano. A sua preocupação é dar um contributo, às famílias, às escolas e à comunidade cristã, no que toca à tarefa educativa sobre este assunto. Trata-se, a nosso ver, de um documento bastante sereno e equilibrado. Por isso, a nuvem de poeira que se levantou na comunicação social sobre o assunto revela o meio fortemente ideologizado que envolve esta matéria.

De facto, dificilmente se encontrará um assunto mais enervante do que este, quando se trata de pensar e propor caminhos sensatos para a cultura de hoje. Grupos e movimentos radicalizados saem a terreiro imediatamente, sem para pensar, sendo precisamente isso que o documento propõe.

As questões ditas de género tem uma história. Começaram por ser desencadeadas pela justa reivindicação de valorizar o papel da mulher na cultura, reconhecendo a sua igual dignidade na família, no trabalho, na política e mesmo na Igreja. Mas o assunto evoluiu e começou também a referir as exigências do reconhecimento das particularidades dos indivíduos quanto à sua instalação na identidade: sexual, biológica, psicológica e social. E aqui abriu-se um sem fim de possibilidades que vão muito para além do justo reconhecimento da identidade homossexual e tornam muito obscuro este assunto.

O documento vaticano propõe justamente que se assente em algumas ideias antropológicas e éticas, como ponto de partida para um diálogo, a caminho de um ordenamento cívico que não perca aquilo que é decisivo para uma mundividência humanista. Entre essas ideias podemos anotar algumas mais importantes.

A primeira é que a identidade de uma pessoa não é estática, mas é suposto evoluir na direcção de se instalar de modo sensato numa forma de existir eticamente responsável. A reivindicação da validade de identidades líquidas ou em formas de instituição, como as ditas “pluri-amorosas”, são caminhos completamente insensatos.

A segunda ideia é a da centralidade e insuperabilidade do valor do masculino e do feminino. Com efeito, segundo a mundividência judaico-cristã este valor é essencial. A existência do masculino e do feminino é a forma originária da comunhão dos seres humanos e da transmissão da vida. Qualquer ideia nova que ponha em causa esta estrutura originária da humanidade não tem qualquer sentido à luz do Evangelho e da moral de Jesus.

Em terceiro lugar, o documento lembra que as instâncias educativas dos países democráticos não podem assentar em radicalismos de minorias agressivas, pois o espaço público não é vazio de valores, mas integrado pelo sentido compartilhado pelas famílias e pelas correntes espirituais que integram a riqueza racional dos povos. Por isso, compete ao Estado de direito velar no sentido de evitar que o sistema educativo seja aprisionado pelas minorias hiper-activas que militam pela ideologia de género.

Sobre este assunto, há muito a fazer, na Igreja e na sociedade. A Igreja, como nota este documento, deve aprender a ouvir e a valorizar o que vivem as pessoas e não apenas a repetir doutrinas. Por sua vez, a cultura tem de aprender a ouvir o imemorial de que nos fala a Escritura. Apesar de todas as acusações que fazem às Igrejas, é no espaço cultural cristão que se deu a evolução no sentido de respeitar as justas reivindicações do género.