Bispo do Porto recebe um abraço do Senhor de Matosinhos

Matosinhos celebra, ao longo de três semanas, aquela que é a sua devoção maior: a do “Bom Jesus”, ou “Senhor de Matosinhos”, num programa recheado de eventos, e que este ano conta, pela primeira vez, com o 1.º Congresso Internacional do Senhor de Matosinhos, entre os dias de 11 a 13 de junho.

Mas o ponto culminante das festas é a celebração da Eucaristia Solene da Festa do Bom Jesus de Matosinhos, na terça-feira seguinte ao domingo de Pentecostes, este ano a 11 de junho. Presidiu à Eucaristia, Dom Manuel Linda, Bispo do Porto. Concelebraram além do pároco e vigário, Pe. Manuel Mendes, os padres ao serviço da Vigararia e outros sacerdotes amigos.

Na celebração eucarística, em que a grande Igreja se tornara pequena para tamanha multidão, estavam presentes, além da Presidente da Câmara Municipal de Matosinhos, Dra. Luísa Salgueiro, e de outros elementos do executivo camarário e da União de Freguesias de Matosinhos e Leça da Palmeira, o Provedor e Irmãos da Santa Casa de Misericórdia de Matosinhos e ainda alguns altos representantes do Senhor de Matosinhos de Congonhas, no Estado de Minas Gerais, Brasil. Esta presença de irmãos, vindos do outro lado do Atlântico, foi muito destacada pelo pároco, que mostrou grande regozijo por esse facto, como sinal de uma comunhão grande entre todos os que se dedicam a valorizar, pelo mundo fora, o culto do Senhor de Matosinhos.

O canto de sereia das ideologias

Na sua Homilia, Dom Manuel Linda assentou a reflexão no episódio bíblico, alusivo à experiência do povo de Deus, que na confiança do “olhar para a serpente elevada no poste encontrava a sua cura” (cf. Nm 21,4-9). Interpretando esta conhecida narrativa do Antigo Testamento, na perspetiva do seu pleno cumprimento no mistério de Cristo, elevado na Cruz (Jo 3,13-17), o bispo do Porto referiu-se à história da humanidade como “uma história de busca da salvação” (Edgar Morin), de procura da redenção, de ânsia por uma vida salva por amor. E insistiu que, em resposta a esta busca de salvação, muitos se apresentaram, no século XX, como “salvadores” e ofereceram “ideologias libertadoras”, que funcionaram como “cantos de sereias”, e precipitariam milhões e milhões de pessoas no abismo da destruição e da morte.

O abraço do Senhor de Matosinhos

Dom Manuel Linda apresentou a figura de Jesus Cristo Crucificado, o Bom Jesus de Matosinhos, como Único Salvador, ontem, hoje e sempre, e insistiu em dois aspetos desta salvação, que redime a nossa vida inteira, por amor: de um ponto de vista negativo, esta salvação é «libertação de tudo o que nos oprime», num processo nunca terminado; mas de um ponto de vista positivo, a salvação brota do abraço misericordioso de Deus, que nos ama, que nos sustenta, que nos toma com uma mãe bondosa ao colo, ou que nos sustenta como pai amoroso nos seus braços fortes.

Autossuficiência é comparável a balões cheios de ar

Esta salvação atinge-nos até ao fundo, até àquele limite dos limites, em que a nossa vida esbarra na porta férrea e intransponível da morte. Mas mesmo aí – disse Dom Manuel Linda – Deus, feito homem em Jesus Cristo, desceu a esse abismo da morte, para daí nos resgatar, para daí nos libertar para uma vida verdadeira e eterna. Neste sentido, “para a Cruz de Cristo, continuam a olhar, desde os primórdios da fé cristã até aos dias de hoje, todos aqueles que põem a sua esperança de salvação no Senhor e não em si mesmos ou nas suas obras. Aqueles que julgam não precisar de salvação, aqueles que se tomam por autossuficientes, e aqueles que dizem não precisar dos outros – e muito menos do Outro absoluto, que é Deus – esses são comparáveis a «balões cheios de ar», cheios de si mesmos, mas que depressa se esvaziam”, reiterou Dom Manuel Linda.

A Cruz – pelo contrário – disse ainda o Bispo do Porto – ensina-nos a levantarmo-nos para o alto, a não nos fiarmos de nós mesmos, a pormos a nossa confiança num amor maior, que nos precede e excede, que nos transcende e nos salva. Foi esta confiança na Cruz do Senhor que, ao longo dos séculos, os matosinhenses souberem testemunhar e partilhar.

O mar traz coisas boas

Os matosinhenses – disse Dom Manuel – acolheram a cruz como dom de salvação e rapidamente a levaram além-mar. Essa é a dinâmica própria de uma terra abençoada pelo mar e com um próspero porto de mar. “O mar traz coisas boas”, como nos trouxe a venerável imagem do Senhor de Matosinhos, em tamanho natural, a mais antiga existente em Portugal, e desde há mais de seis séculos, como reza a tradição local. Mas essas coisas boas devem ser acolhidas e agradecidas, para serem logo oferecidas e partilhadas. Disso é sinal a forma como o culto do Senhor de Matosinhos chegou ao Brasil.

Inculturando a sua mensagem, numa terra de horizonte e mar, como é a de Matosinhos, o bispo do Porto, lembrou esta vocação “marítima” de saber acolher e agradecer, de receber e devolver, de ir e de voltar, para partilhar todos os bens recebidos. Por isso, a melhor atitude, sugeriu o Bispo a concluir a sua sugestiva homilia “improvisada” – é a de “elevarmos as mãos para o alto e rezarmos: «obrigado, Bom Jesus, Senhor de Matosinhos, por tudo o que nos dais»”.

No final da celebração Dom Manuel Linda recebeu “um abraço do Senhor de Matosinhos”. Não é apenas o título de um conto de Rita Sineiro, com desenhos de Avelino Leite. É o melhor título para a forma como o Bispo foi acolhido e presenteado, com diversos elementos cultuais e culturais da devoção ao Senhor de Matosinhos. E sobretudo esta “abraço” traduz a forma entusiasta como um “mar de gente” acolheu o seu Bispo, que é Pastor e timoneiro, ao leme desta amada diocese do Porto.

 (AG)