Ciências naturais e a fé cristã (23) Origem da Criação e o começo do Universo (I)

Encaminho-me, a passos largos, para o fim desta rubrica que, com muito gosto, tenho vindo a trazer aos leitores da “Voz Portucalense”.

Por Alexandre Freire Duarte

Este será, com efeito, o primeiro texto, de mais um conjunto de três, acerca do penúltimo tema que penso abordar. Em concreto: sobre a relação entre o começo do Universo e a origem da Criação.
Desta feita, principio esta temática com uma partilha acerca do que se tem revelado uma constante nas minhas aulas universitárias de “Mundividência Cristã” em cursos – que não os de Teologia – na Universidade Católica, em particular quando justamente falo do contributo do Cristianismo para o surgir das ciências naturais. A saber: não tem havido nenhum ano lectivo em que alguém não refira algo como “a ciência diz algo de totalmente diferente do Cristianismo acerca do começo do Universo”.

Nessas circunstâncias, procuro seguir uma aclaração que, inclusive abordando aspectos que já expus nesta rubrica, não é muito diferente da que passarei a apontar daqui em diante. Desde logo, e depois de deixar claro os âmbitos distintos (mas não necessariamente opostos, dado que ambos se debruçam, em parte, sobre as mesmas realidades) da fé cristã e das ciências naturais, tendo a procurar deixar claro a diferença entre “começo” e “origem”.

O “começo” é uma noção complexa que (mormente porque, até na prática e com toda a propriedade, nada
logramos deslindar a começar, mas só depois de ter começado) remete para um acto intelectual que faz uma distinção entre um “antes” e um “depois”, ou, pelo menos, entre um “momento” e, em teoria, algo que, acaso existisse um “antes” desse “momento”, não provocaria nenhuma influência em tal “momento”. É assim que a teoria ou hipótese do “Big Bang” (ou explosão cósmica inicial) – avançada pela primeira vez pelo sacerdote católico Georges Lemaître – pode ser considerada a descrição mais plausível acerca do começo do Universo.

Já a noção de “origem” é de outra esfera da de “começo”. De facto, ela é de um nível, não cronológico nem físico, mas “para além da física” e própriamente intemporal, apontando para a circunstância, não isolável temporalmente (nem ao nível dos eventos físicos), de uma criação total de tudo o que existe. Se assim é, a “origem” implica, na sua própria compreensão, a ideia de “criação” e a realidade de um Criador que, pelo Seu acto criador, suscita e sustém “continuamente”, de modo intencional e consciente, toda a realidade diferente de Si.

Posto isto, é um facto que a “origem” da Criação é mais facilmente apreensível na ponderação “do começo” do Universo, pois este é, por assim dizer, o instante em que aparece o que existe. Contudo, com isto bem patenteado e por mais estranho que possa parecer, até pode haver “origem” sem haver “começo”.