Encerrava-se a celebração pascal na Sé do Porto, ao som espiritual do Alleluia do Messias de Haendel, cantado pelo coro da Sé do Porto com espírito festivo e profunda sensibilidade pascal, e com entusiástico acolhimento por parte dos fiéis que enchiam o templo.
Por M. Correia Fernandes
Este acontecimento contrastava dolorosamente com a notícia sabida nessa manhã do atentado que matava mais de 300 pessoas em várias igrejas e em hotéis do Sri Lanka. As imagens subsequentes mostravam a destruição e olhos de dor das comunidades locais, com imagens partidas e caixões perfilados perante o olhar atónito dos responsáveis de uma dessas comunidades cristãs e católicas minoritárias naquela parte do mundo.
Pouco mais de dois por cento da população daquela região, tanto no Sri Lanka como na Índia, é cristã, e deles, dos cristãos, a maioria são católicos. Na Índia (como no Ceilão), evangelizada desde o século XVI por S. Francisco Xavier e por tantos outros missionários que desde então procuraram contrariar a agressividade e ambição dos colonos por um espírito evangélico de fraternidade, quantos deles morrera também mártires, como temos o exemplo de S. João de Brito, na Índia, que quis evangelizar no século XVII.
É simbólico que sejam as minorias a ser vítimas da violência, já que na região predomina religião Hindu e Budista da maioria da população. Mas é admirável a persistência da presença cristã, em espírito pacífico, e de valorização das comunidades humanas, bem como a presença de igrejas como aquela cuja fachada encheu também as imagens reveladas. Não longe dali, em Meliapor, numa igreja de estilo neogótico nas proximidades de Chenai, continente
indiano oriental, regista-se a memória de D. António Barroso, que ali foi missionário e bispo de 1897 a 1899).
A comunicação social falava de atentados motivados pela religião. Parece ser uma visão distorcida da realidade. Como depois se soube, a destruição, que incidiu sobre centros religiosos, foi levada a cabo, não por fundamentalismo religioso, mas por fanatismo inculcado em pessoas que também são vítimas de quem não assume os valores religiosos, incluindo os do Corão, mas que transformam em violência a afirmação do sentido religioso.
Soube-se que os atentados foram perpetrados por bombistas suicidas (espírito também contrário ao sentido religioso), comandados à distância pela organização Daesh, ao que perece a partir da Síria, conjugado com a desatenção das autoridades locais aos indícios da preparação dos atentados.
Não podemos deixar de associar estes atentados com elevado número de vítimas, a outros já antigos e talvez esquecidos, como o das torres de Nova Iorque, o do comboio em Madrid, o da discoteca em Paris, o do metro de Londres, e mais recentemente o da mesquita na Nova Zelândia (de que Jorge Cunha falou no seu texto na Voz Portucalense de 20 de março de 2019, com o título “Um crime abjecto”, evidenciando a nota do atentado contra o direito à liberdade religiosa).
Neste mesmo drama se inserem os atentados agora perpetrados: não é a questão religiosa que está em causa: é o drama da insensibilidade humana, o drama da violência, o drama da vingança. Por isso o Papa Francisco, na sua mensagem pascal, apelava ao “fim de uma cultura da vingança”. E no dia seguinte apelava a que “todos condenem estes atos terroristas, atos desumanos, que nunca se podem justificar”, endereçando a sua solidariedade ao arcebispo e à comunidade católica de Colombo.
Tudo isto deve sensibilizar toda a comunidade humana para superar as “sementes de violência”, que não se evidenciam apenas nos atos terroristas, mas em outras iniciativas que incompreensivelmente se transformam em expressões de violência, como a manifestação dos chamados “coletes amarelos”, cuja “razão” é destruída pela violência gratuita e irracional. Mesmo a chamada “violência revolucionária” tão endeusada pelas doutrinas políticas, é um germe de múltiplas violências que destroem a convivência e a comunidade humana.
E que diremos da “violência verbal” que informa o discurso de dirigentes políticos e do mundo desportivo. Uma coisa é a legítima defesa de propostas governativas, outra é o método da violência que se tem vindo a instalar sub-repticiamente no nosso tecido social.
Importa por isso uma mudança de paradigma de linguagem, que saia do agressivo para o lançamento de propostas e projetos de construção, em vez do lançar de semente de violência, que depois desabrocham em atos como aqueles que nos entram pelos olhos e que condenamos como frutos, sem pensar onde se encontram as suas sementes. São as “sementes de violência”