Há dias, numa visita ao “Parque Oriental do Porto”, reparei num colega de infância que não via há muito tempo. Vinha acabrunhado. Perguntei-lhe o que se passava. Respondeu-me: – “Perdi a minha maior riqueza. Minha mulher morreu há três anos”.
Por João Alves Dias
Enquanto caminhávamos, falou-me da sua vida de casal, dos projetos que realizaram, das dificuldades que foram vencendo, das horas amargas por que passaram, dos confrontos, das cumplicidades, do companheirismo. – “Foram muitos anos de partilha e de solidariedade.” Quando, ao chegar ao carro, lhe apresentei minha esposa, disse-me: – “Aqui está a tua maior riqueza! Cuida bem dela! A minha já não a tenho. Não compreendo como há casais que não se entendem …”
Este desabafo doloroso levou-me a reler «A Alegria do Amor» . Nela, o Papa Francisco diz que a primeira das treze exigências do “amor quotidiano” é a paciência. “O problema surge quando exigimos que as pessoas sejam perfeitas, ou quando nos colocamos no centro esperando que se cumpra unicamente a nossa vontade. Então tudo nos impacienta, tudo nos leva a reagir com agressividade.
Se não cultivarmos a paciência, sempre acharemos desculpas para responder com ira, acabando por nos tornarmos pessoas que não sabem conviver, antissociais incapazes de dominar os impulsos, e a família tornar-se-á um campo de batalha. Esta paciência reforça-se quando reconheço que o outro, assim como é, também tem o direito de viver comigo nesta terra. O amor possui sempre um sentido de profunda compaixão, que leva a aceitar o outro mesmo quando agir de modo diferente daquilo que eu desejaria (Nº 91). Sábias palavras! Paciência que tanto falta e que tanta falta faz…
Em contraponto, nesse mesmo dia, num jantar de aniversário, o festejado vinha com cara de paraíso. Acabava de lhe nascer um neto. Disse ao filho: – “Vós destes-me a melhor prenda”. Os netos são os rebuçados com que Deus nos adoça a vida numa idade em que temos menos preocupações e mais tempo para os saborear. São resposta finita à nossa fome de infinitude.. Mais uma vez fui ler a Exortação Apostólica. “Muitas vezes são os avós que asseguram a transmissão dos grandes valores aos seus netos. As suas palavras, as suas carícias ou a simples presença ajudam as crianças a reconhecer que a história não começa com elas, que são herdeiros de um longo caminho e que é necessário respeitar o fundamento que as precede.
Quem quebra os laços com a história terá dificuldade em tecer relações estáveis e reconhecer que não é dono da realidade. Com efeito, a atenção aos idosos distingue uma civilização” (Nº 192). Dou-Te graças, Senhor, pela vida que em nós renasce. Pelas sementes que germinam em nossos caminhos. Pelos amigos que nos expandem e vivificam. Que nesta Páscoa possamos dizer como Drummond de Andrade: “E nosso amor, que brotou/ Do tempo, não tem idade/ Pois só quem ama/ Escutou o apelo da eternidade.”.