
Há dias estava em uma celebração da Palavra e deparei com uma senhora em cadeira de rodas, que não abriu os olhos e estava deitada sobre o seu lado esquerdo.
Por Joaquim Armindo
Esteve assim durante todo o tempo e mesmo depois. Na saudação da paz fui ao seu encontro dei-lhe um beijo de paz e perguntei “como está?”. Disse qualquer coisa que não sei o que foi. No fim dirigi-me a ela disse umas palavras, mas a senhora ou não ouviu, ou não entendeu, ou ouviu e entendeu, mas não falou. Serviu esta situação, para refletir sobre tudo o que se passa na humanidade. Porque ali, naquele corpo curvado estava a humanidade. E mais, estava o Jesus que celebrávamos. Por isso, comecei a pensar que aquela senhora entendeu tudo, e muito mais que eu. Na sua aparente sonolência, de cadeira de rodas, estava a celebrar a libertação de toda a vida, na Vida de Jesus morto. Naquele corpo franzino estava também a Vida de Jesus Ressuscitado. Só que nós, principalmente os ministros do culto, só reparamos em quem nos sorri, e diz bem de nós. Às vezes não queremos ver a morte que tantos vivem, na esperança da ressurreição.
Não sei o nome da senhora – reparem que nem sequer o perguntei! -, nem a sua vida. Mas sei que a teve. Certamente preocupada com o marido, os seus filhos e seus netos, com a sua casinha e com a dimensão de gerir os seus custos. Agora, agora, está ali, numa cadeira de rodas, todo o pescoço para a sua esquerda e de olhos fechados. Talvez vá do seu quarto para o refeitório e deste para o seu quarto. Talvez fale muito com Deus, e é nestas ocasiões que são a nossa vanguarda mais avançada. Não é uma senhora sem-tempo, como nós, mas com-tempo para estar com Jesus. Talvez o seu único companheiro fiel nesta fase da sua vida. Talvez o único que se importe com ela. Já não olha para os lírios do campo, nem as aves do céu, porque é um lírio do campo e uma ave do céu.
Podíamos escrever muito mais coisas. Não é uma situação que qualquer um de nós quisesse, embora para lá caminhamos. Quando se discute tanta coisa, mas não se fala nestas vidas. Porque queremos viver, mas não olhar para as nossas obrigações urgentes, prioritárias e inadiáveis.
Olhem a vida, senhores!