Vimos já, que nos seu importante discurso à assembleia plenária da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos (14 de fevereiro de 2019), o Papa Francisco pôs na agenda pastoral da Igreja, com carater de prioridade, a formação litúrgica.
Por Secretariado Diocesano da Liturgia
E, entre as várias modalidades de que se pode revestir esta formação, privilegiou a via da mistagogia.
«Mistagogia» é uma modalidade de catequese litúrgica muito praticada pela Igreja antiga e que teve protagonistas de eleição no Oriente e no Ocidente. Basta recordar o nomes de Orígenes, Tertuliano, S. Cirilo de Jerusalém, Teodoro de Mopsuéstia, São João Crisóstomo, S.to Ambrósio de Milão, S.to Agostinho, S. Leão Magno, S.to Isidoro de Sevilha, S.to Ildefonso de Toledo… Estes Padres da Igreja tinham em comum com o atual Papa a ideia de que «a liturgia é vida que forma, não ideia a aprender». Para eles «a realidade é mais importante do que a ideia» (cf. EG 231-233).
Os Padres da Igreja pensavam que não fazia sentido «explicar» os sacramentos antes da receção dos mesmos. Porventura até seria contraproducente porque privaria essa celebração do seu impacto mais que formativo porque performativo.
A explicação dos ritos e das preces só fazia sentido a partir da experiência do sacramento celebrado, e nunca antes. Antes era o tempo da introdução à história da salvação – iniciação bíblica – da conversão dos costumes à moral evangélica e, já às portas da celebração dos sacramentos da Iniciação cristã, da introdução ao credo e à oração do Senhor. Francisco está na mesma atitude de fundo ao afirmar que a «a formação litúrgica não pode limitar-se a oferecer simplesmente conhecimentos, ainda que necessários, acerca dos livros litúrgicos, e nem sequer a tutelar o devido cumprimento das disciplinas rituais». Isso pode ficar para uns tantos especialistas, peritos na ciência litúrgica. Mas a Liturgia deve cumprir uma função formadora e transformadora em relação a todos, pastores e fiéis.
O Catecismo da Igreja Católica, apontado por Francisco como referência desta via mistagógica, ensaia repetidamente este método catequético: «A catequese litúrgica visa introduzir no mistério de Cristo (ela é “mistagogia”), partindo do visível para o invisível, do significante para o significado, dos “sacramentos” para os “mistérios”» (n. 1075).
Na Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos que se debruçou sobre a Eucaristia como cume e fonte da vida da Igreja (Outubro de 2005) vários dos participantes ergueram a sua voz para urgir o retomar da mistagogia do mistério eucarístico. E o Papa emérito, Bento XVI, na exortação apostólica pós-sinodal Sacramentum Caritatis (22 de fevereiro de 2007) dedicou um longo parágrafo – o nº 64 – a este tema. Recordava Bento XVI:
«Os padres sinodais indicaram unanimemente a estrada duma catequese de carácter mistagógico, que leve os fiéis a penetrarem cada vez mais nos mistérios que são celebrados …
Desta estrutura fundamental da experiência cristã parte a exigência de um itinerário mistagógico, no qual se hão-de ter sempre presente três elementos:
a) … a interpretação dos ritos à luz dos acontecimentos salvíficos, em conformidade com a tradição viva da Igreja; … b) introduzir no sentido dos sinais contidos nos ritos; … mais do que informar, a catequese mistagógica deverá despertar e educar a sensibilidade dos fiéis para a linguagem dos sinais e dos gestos que, unidos à palavra, constituem o rito; c) … mostrar o significado dos ritos para a vida cristã em todas as suas dimensões: trabalho e compromisso, pensamentos e afectos, actividade e repouso; … pôr em evidência a ligação dos mistérios celebrados no rito com a responsabilidade missionária dos fiéis».
Apresentado o método, resta pô-lo em prática, «ajudando concretamente o Povo de Deus a interiorizar melhor a oração da Igreja, a amá-la como experiência de encontro com o Senhor e com os irmãos e, à luz disto, redescobrir os seus conteúdos e observar os seus ritos» e preparando os ministros ordenados «em vista de uma sã ars celebrandi».