Domingo III da Quaresma

Leitura do Livro do Êxodo                                                        Ex 3, 1-8a.13-15

«O que Se chama ‘Eu sou’ enviou-me a vós».

 

Salmo Responsorial                                                                     Salmo 102 (103)

O Senhor é clemente e cheio de compaixão.

 

Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios       1 Cor 10, 1-6.10-12

«Esses factos aconteceram para nos servir de exemplo».

 

Aclamação ao Evangelho           Mt 4, 17

Louvor a Vós, Rei da eterna glória.

Arrependei-vos, diz o Senhor; está próximo o reino dos Céus.

 

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas              Lc 13, 1-9      

«E se não vos arrependerdes, morrereis todos do mesmo modo».

«Senhor, deixa-a ficar ainda este ano, que eu, entretanto, vou cavar-lhe em volta e deitar-lhe adubo».

 

Viver a Palavra

No quotidiano da nossa vida, entre os múltiplos afazeres do dia-a-dia que tantas vezes nos distraem e fazem dispersar, Deus faz-se presente, irrompendo na nossa história com uma paciente misericórdia que faz dos nossos corações lugares de conversão permanente.

Assim aconteceu com Moisés, que pastoreando o rebanho de Jetro, seu sogro, foi visitado por Deus naquela sarça que ardia sem se consumir. Naquela teofania, Deus revela-se para que Moisés fosse portador da vontade libertadora de Deus que compadecido pela situação do Seu Povo no Egipto, o quer libertar da escravidão e constituí-lo como Povo eleito.

Deste modo, a história de amor e de salvação que Deus estabelece com Israel, torna-se lugar de manifestação das maravilhas de Deus e S. Paulo recorda à comunidade de Corinto que a nossa história, à semelhança da história de Israel é chamada a ser história de amor e lugar concreto de manifestação da condescendência de Deus. Neste mesmo sentido, no Evangelho, Jesus ensina-nos a ler os acontecimentos da história como lugares de interpelação da efemeridade da nossa vida, evitando qualquer leitura catastrófica e castigadora, mas reconhecendo que o nosso quotidiano na diversidade do seu acontecer é um constante apelo à conversão e à transformação do coração.

Deste modo, o grande desafio da vida cristã não é procurar sinais extraordinários e espectaculares da manifestação de Deus, mas precisamente no ordinário da vida, na normalidade da nossa existência, descobrir a beleza da acção silenciosa e misericordiosa de Deus. É a permanente lógica do mistério da Incarnação que nos recorda o modo que Deus escolhe para se relacionar connosco: assume a nossa natureza humana, faz-se presente na nossa história e revela-nos a grandeza do Seu amor, revelando-se por meio de «palavras e gestos intimamente ligados entre si» (DV 2). Torna-se ainda mais bela a acção de Deus quando se realiza deste modo, pois ao invés de um Deus que opera acções pontuais e extraordinárias na história, tomamos consciência que somos filhos amados de um Deus que se faz presente na sucessão dos nossos dias e que caminha ao nosso lado oferecendo sentido à nossa existência.

Assim, pode dizer-se que a Liturgia da Palavra de hoje se apresenta como uma janela com vista directa para o coração de Deus e permite-nos vislumbrar o modo como Deus se relaciona connosco. O diálogo que Deus estabelece com Moisés na sarça ardente revela-nos o desvelo e o cuidado que Deus nutre pelo homem e pela mulher, obra das Suas mãos: «Eu vi a situação miserável do meu povo no Egipto; escutei o seu clamor provocado pelos opressores. Conheço, pois, as suas angústias. Desci para o libertar das mãos dos egípcios e o levar deste país para uma terra boa e espaçosa, onde corre leite e mel».

Estas quatro formas verbais – «vi», «escutei», «conheço» e «desci» – manifestam a absoluta condescendência de Deus e a dinâmica da Sua relação connosco. O Deus do amor e da misericórdia não é indiferente às nossas dores e angústias e escuta os gritos da nossa limitada condição humana. Ele conhece a nossa frágil humanidade com os seus clamores e desilusões e, por isso, desce ao nosso encontro e faz-se presente na nossa caminhada. Esta dinâmica de salvação assume carácter pleno, total e definitivo na incarnação de Jesus Cristo, que vem ao nosso encontro como rosto da misericórdia do Pai, não para condenar, mas para anunciar a paciente misericórdia de Deus, que como o vinhateiro acredita que com paciência, perseverança e cuidado aquela figueira pode gerar frutos. Por isso, como cantamos no Salmo – «O Senhor é clemente e cheio de compaixão – e a sua misericórdia renovam no nosso coração a esperança e oferecem à nossa vida uma nova oportunidade e um renovado sentido.

 

Homiliário patrístico

Dos Sermões de São Pedro Crisólogo, bispo (Séc. IV)

Há três coisas, irmãos, pelas quais se confirma a fé, se fortalece a devoção e se mantém a virtude: a oração, o jejum e a misericórdia. O que pede a oração alcança-o o jejum e recebe-o a misericórdia. Oração, jejum e misericórdia: três coisas que são uma só e se vivificam mutuamente. O jejum é a alma da oração, e a misericórdia é a vida do jejum. Ninguém tente dividi-las, porque são inseparáveis. Quem pratica apenas uma das três, ou não as pratica todas simultaneamente, na realidade não pratica nenhuma delas. Portanto, quem ora, jejue; e quem jejua, pratique a misericórdia. Quem deseja ser atendido nas suas orações, atenda as súplicas de quem lhe pede, pois aquele que não fecha os seus ouvidos às súplicas alheias, abre os ouvidos de Deus às suas próprias súplicas.

Quem jejua, entenda bem o que é o jejum: seja sensível à fome dos outros, se quer que Deus seja sensível à sua; seja misericordioso, se espera alcançar misericórdia; compadeça-se, se pede compaixão; dê generosamente, se pretende receber. Muito mal suplica quem nega aos outros o que pede para si. Homem, sê para ti mesmo a medida da misericórdia; deste modo alcançarás misericórdia como quiseres, quanto quiseres e com a prontidão que quiseres; basta que te compadeças dos outros com generosidade e prontidão.

Façamos, portanto, destas três virtudes – oração, jejum, misericórdia – uma única força mediadora junto de Deus em nosso favor; sejam para nós uma única defesa, uma única operação sob três formas distintas.

 

Indicações litúrgico-pastorais

  1. O segundo cais da nossa caminhada quaresmal diocesana é o cais da conversão. Desafiados por Jesus no Evangelho, somos chamados à conversão, na certeza da paciente misericórdia de Deus. Comunitariamente somos chamados esta semana a pensar criativamente o modo de concretizar uma saída missionária levando e difundindo uma mensagem de conversão (Escola, Ecologia, Comunicação Social, Mundo digital). Como discípulos missionários somos chamados a concretizar acções missionários: escutar e falar, sem pressa, com uma pessoa que encontrar num caminho da aldeia ou numa rua da nossa cidade; escutar a história de vida de alguém que nos parece distante de Deus e identificar os sinais da Sua presença; participar na iniciativa 24 horas para o Senhor. Deste modo, prepararemos o coração para a Páscoa do Senhor e caminharemos em comunhão com a Igreja Diocesana rumo ao Porto da Paz.

 

  1. Para os leitores: na primeira leitura, a proclamação deve ter em conta o diálogo estabelecido entre Moisés e o Senhor Deus. Deve haver uma especial atenção para com as perguntas presentes no texto, bem para as diferentes frases no discurso directo como o chamamento: «Moisés, Moisés!» e a sua resposta: «Aqui estou!». A entoação da leitura deve ser cuidada para que não haja uma excessiva dramatização do texto nem uma leitura apática das diferentes intervenções. A segunda leitura não apresenta nenhuma dificuldade aparente, pelo que uma boa preparação, tendo em conta as pausas e as respirações nas frases mais longas, ajudará a uma proclamação mais eficaz do texto.

 

Sugestões de cânticos

Entrada:  Os meus olhos estão sempre fixos no Senhor – M. Faria (BML 50); Salmo Responsorial: O Senhor é clemente e cheio de compaixão (Sl 102) – F. Santos (BML 35); Aclamação ao Evangelho: Louvor a Vós, Rei da eterna glória. Arrependei-vos, diz o Senhor – F. Santos (BML 35); Ofertório: Vós, Senhor, sois o nosso Pai – C. Silva  (OC 278); Comunhão: Felizes os que habitam – M. Valença (NRMS 48); Final: Ditosos os que te louvam sempre – F. Santos (NCT 109).