Biblioteca Almeida Garrett celebra 90 anos de Fernando Echevarría

Com atribuição da Medalha de Mérito Cultural do Ministério da Cultura.

Por M. Correia Fernandes

Teve início no dia 26 de fevereiro, e prolonga-se até 26 de março a exposição “Folhas de Poesia”, promovida no dia dos 90 anos de Fernando Echevarría. Esta é uma homenagem que o Município do Porto, através da Biblioteca Almeida Garrett, presta a uma das figuras mais originais da poesia de face humanista e voltada para o sentido dos valores espirituais, conforme tem evidenciado nestas páginas o Cónego e professor Arnaldo de Pinho. A homenagem a Fernando Echevarría incluiu a inauguração da exposição a que foi dado o título “Folhas de Poesia – nos 90 anos de Fernando Echevarría”, no dia em que o poeta completou 90 anos de idade (nasceu a 26 de fevereiro de 1929), e a entrega da Medalha de Mérito Cultural, atribuída pelo Ministério da Cultura, como “reconhecimento do inestimável trabalho difundindo a língua e a cultura portuguesas, ao longo de mais de 60 anos”, como foi anunciado em 19 de fevereiro de 2019. A entrega deste reconhecimento foi presidida pela Ministra da Cultura, Graça Fonseca. O evento contou também com a presença do anterior ministro da Cultura, Luís Castro Mendes.

Como salienta o Ministério da Cultura, a homenagem visa reconhecer “o inestimável trabalho de uma vida dedicada à poesia e à escrita, difundindo a língua e a cultura portuguesas, ao longo de mais de 60 anos”. Trabalho esse que a Câmara do Porto distinguiu já em 2008 e que agora retrata na exposição, cujo título é inspirado numa das revistas literárias em que o poeta publicou um dos seus primeiros poemas. Isso salientou a ministra nas palavras pronunciadas no ato de homenagem. O poeta agradeceu o reconhecimento e apelou à valorização da língua e dos valores humanos e culturais. Significativa foi a presença de numerosos professores da Faculdade de Letras e outros docentes. A exposição “Folhas de Poesia – nos 90 anos de Fernando Echevarría”, inclui os exemplares da sua bibliografia, bem como dos estudos que sobre ela têm sido publicados na imprensa, designadamente em revistas literárias a partir já dos anos de 1950 e 1960, o registo das homenagens e prémios literários, incluindo a atribuição da Medalha de Ouro da Cidade do Porto, com que foi agraciado em 2008.
Destacam-se igualmente manuscritos do acervo da Biblioteca Pública Municipal do Porto, bem como o primeiro livro de poemas, “Entre Dois Anjos” (1956), e o mais recente, “Via Analítica” (2018), bem como um conjunto de gravuras de Flor Campino, que ilustram a obra “Ritmo Real”, publicada em 1971. Sobre o seu último livro “Via Analítica” recomendamos a releitura do comentário crítico de Arnaldo de Pinho, publicado na Voz Portucalense de 21 de novembro de 2018. Nele escreve: “Todo o versejar de Echevarría é poièsis, neste preciso sentido de relação entre arte e verdade, entre arte e descoberta da verdade, entre-arte-a-caminho para a verdade”. E continua: “Se já nos textos anteriores esta experiência que se diz, por “desenredamento” (palavra sua) do que se vê e sente, ao contemplar a terra, o mar, o rio, as estações, neste livro, é mais visível a temática da morte, do nevoeiro, do silêncio, pois que o “fim da tarde lucila”,, “começa pelo mar a plenitude”, enfim, “anoiteceu para dentro”.
Fernando Echevarría foi distinguido já com numerosos prémios: Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique e três vezes Grande Prémio de Poesia
APE/CTT (1981, 1991 e 2009). Foi também distinguido com o Grande Prémio de Poesia do P.E.N Clube Português (em 1982 e 1999), com o Prémio de Poesia Luís Miguel Nava, o Prémio Nacional de Poesia António Ramos Rosa, o Grande Prémio de Poesia Inasset/INAPA, o Prémio Eça de Queiroz, o Prémio de Cultura Padre Manuel Antunes (2005), o Prémio de Poesia Teixeira de Pascoaes, o Prémio D. Diniz e o Prémio Correntes d’Escritas/ Casino da Póvoa, com a obra “Categorias e outras paisagens”, em 2015 (prémio que neste ano e por estes dias distinguiu outro poeta, Luís Quintais na 20.ª edição deste festival literário que este ano foi também dedicado à poesia, com a obra “A noite imóvel”). Em 2007, foi condecorado o com o grau de Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, pelo Presidente Aníbal Cavaco Silva.

Embora natural da província de Cantábria, no norte de Espanha, cedo veio para Portugal, o que lhe permitiu o perfeito domínio da língua e o conduziu a uma escrita em português (e excepcionalmente em espanhole francês). Cursou Humanidades, e depois Filosofia e Teologia em escolas de Espanha. Esteve exilado em Argel e Paris, onde fixou residência em 1966, tendo mais tarde regressado a Portugal. Segundo a nota do Ministério, “a sua poesia começa a afirmar-se no final dos anos 1950 com o seu primeiro livro “Entre Dois Anjos”, publicado em 1956, e depois com “Tréguas para o Amor” (1958), “Sobre as Horas” (1963)
e “Ritmo Real” (1971), “como um livro de arte com dez gravuras originais da autoria de Flor Campino”, segundo a mesma fonte. Colaborou com várias revistas nacionais e brasileiras, designadamente, Anto, Graal, Eros, Nova Renascença, Cavalo Azul, Colóquio/ Letras, A Phala – Um Século de Poesia (1888-1988), Hífen e Limiar. A sua poesia está traduzida em francês, castelhano, italiano, inglês, romeno e esloveno, estando representada em diversas antologias portuguesas e estrangeiras, entre as quais “Antologia” – Prémio Almeida Garrett de 1954 (1957), “Alma Minha Gentil – Antologia de Amor Portuguesa” (1957) e “Nas Mãos de Deus – Antologia da Poesia Religiosa Portuguesa” (1978) – estas duas últimas organizadas por José Régio e Alberto Serpa. Uma das mais recentes edições de poesia sua data de 1997, Eros de Passagem – Poesia Erótica Contemporânea, com seleção e prefácio de Eugénio de Andrade. Em colectâneas estrangeiras, está representado na “Antologia de la Nueva Poesia Portuguesa” (1962), e “Antologia de la Poesia Portuguesa Contemporánea” (1981), ambas organizadas por Ángel Crespo, e em “Poesia Portuguesa Contemporânea”., organizada por Carlos Nejar e publicada no Brasil em 1982. Outros títulos a registar da sua bibliografia: “Uso de Penumbra”, “Epifanias”, “Obra inacabada”, “Poesia (1987-1991), “Lugar de estudo” (2009).

Para podermos ouvir a sua palavra:

Por trás do céu há o céu inteligível. / E, por trás deste, um céu aberto a abrir-se ainda, sem qualquer limite,/ mas puxando após si o pensamento. Ou, se quiserem, o feliz requinte / de alargarem a paz a um céu inédito / onde o reino profundo do invisível / funda o visível no fecundo aspecto / de ímpeto. Lume imperioso. Riste / abrindo a um novo assunto de silêncio. / E através do silêncio silencia-se /o assunto. Apenas o incremento / do ímpeto se abstrai ao eco do que disse /para o luto do dito abrir assento / a um penúltimo cume./ A um trampolim de invisível / a ir pelo invisível dentro.