Arábia Saudita: esperanças infundadas

Nos primeiros meses deste ano de 2018, foram muitas as notícias e muitos os comentários da imprensa internacional relativos a algumas mudanças surpreendentes, que começaram a ocorrer na Arábia Saudita.

Por António José da Silva

Eram, na maior parte dos casos, textos laudatórios, já que essas transformações vinham abalar alguns dos alicerces de uma sociedade profundamente conservadora, regida por uma interpretação demasiado rigorista do islamismo, e vocacionada para defender os crentes da influência maléfica de outras culturas, nomeadamente a ocidental: o wwabismo.

As mudanças que mais chamaram a atenção da opinião pública diziam respeito à condição e ao papel das mulheres na sociedade, e foram suficientemente significativas e inesperadas para fazer do seu grande mentor uma autêntica vedeta entre os Meios de Comunicação internacionais: falamos do príncipe herdeiro do trono saudita, Mohamed ibn Salman.

Embora fosse visível algum cepticismo quanto à extensão e à profundidade das mudanças em curso, não faltou quem acreditasse que poderíamos estar a assistir ao começo, naquele país, de uma verdadeira revolução pacífica, que poderia ser a concretização da tão desejada e sempre adiada primavera árabe. Inesperadamente, tudo parece ter mudado com a morte de um jornalista, morte que ocorreu no consulado da Arábia saudita em Istambul, na Turquia.

Apesar de não serem ainda suficientemente claros rodos os pormenores que levaram a esse desfecho, já ninguém acredita que o governo de Riad possa lavar as mãos da morte horrível de Kamal Khashogi, um jornalista que trabalhava para um conhecido jornal americano e que se deslocara àquele consulado para tratar de papéis necessários para o seu casamento. Esses pormenores poderão responder às grandes dúvidas que se levantaram justificadamente sobre a responsabilidade do governo de Riad neste assassínio. É uma responsabilidade de que não se poderá livrar facilmente, dada a presença confirmada de agentes dos serviços secretos saudis em Istambul, precisamente no dia do desaparecimento daquele jornalista.

Seja como for, o reino saudita sai profundamente manchado deste episódio trágico, do qual se poderá dizer que não só provocou a morte horrorosa de um inocente mas que também feriu de morte a imagem de um príncipe de quem se esperava muito para a transformação política da Arábia Saudita. É verdade que as transformações iniciadas pelo príncipe Ibn Saud, que são extremamente louváveis, incidiam sobretudo na área dos costumes sociais, mas esperava-se que acabassem por chegar também às estruturas políticas do país. Ora, tudo parece indicar que, no essencial, o regime não mudará. Este episódio trágico veio provar que, infelizmente, essas esperanças eram infundadas