Dois Bispos do Porto, homens de Deus

Foto: Rui Saraiva

Este mês de agosto trouxe-nos insistente a memória de dois Bispos do Porto, separados por um século: D. António Barroso, falecido a 31 de agosto de 1918; e D. António Francisco dos Santos, nascido a 29 de agosto de 1948 e falecido a 11 de setembro de 2017.

Por M. Correia Fernandes

O primeiro andava em 64 anos quando faleceu, em pleno verão; o segundo completava 70 anos neste 29 de agosto. São duas fi guras marcantes: D. António Barroso morreu com fama de santidade, após uma dolorosa enfermidade, em resultado das dores sofridas pelo seu duplo exílio entre 1911 e 1914 e depois em 1917; D. António Francisco dos Santos morreu na manhã seguinte a um dia em que a diocese, guiada pela sua palavra lúcida e animosa, tinha saído de uma peregrinação diocesana que lhe tinha enchido o coração.

Morreu de repente na manhã de 11 de setembro de 2017. Foi semelhante a reação da cidade e da diocese perante estas mortes: os fi éis, cristãos ou mesmo não cristãos, marcarem presença dolorosa mas esperançosa, na celebração fúnebre. Os relatos de 1918 falam de expressões de veneração por milhares de pessoas e de um longo cortejo que percorreu a cidade do Bonfi m até à Catedral. A vivência de 13 de setembro de 2017 está ainda na nossa memória: a presença das mais altas autoridades do país e da cidade, um Requiem de Mozart em que o ”Cum sanctis tuis” (com os teus santos para sempre) traduzia misteriosamente o sentido dessa hora, enquanto o esquife aparecia aos olhos inundados de milhares de pessoas no terreiro da Sé. São emoções que a Igreja do Porto viveu e que permanecem no fundo dos corações.

Um pequeno pontificado de D. António Francisco, de apenas quatro anos, criou na consciência das gentes um sentimento de incontida admiração. Fisicamente, um era alentado e imponente; outro era pequeno mas de alma grande e grandes capacidades e com um forte sentido do acolhimento. Em tempos em que sobressaem, por vezes artificialmente, os males e as maldades, as figuras endeusadas do espetáculo e do desporto, pouco se presta atenção às almas grandes e aos grandes projetos e ações.

D. António Barroso foi declarado servo de Deus pelas suas reconhecidas virtudes e por uma ação pastoral que se dispersou por três continentes. D. António Francisco, entre as paragens de Lamego, de Braga, de Aveiro e do Porto foi aquela presença atenciosa e humilde que cativou os simples e os poderosos, pela disponibilidade humana, pelo valor espiritual, pela luz que irradiava da sua dimensão franzina e sorridente.

Esta é uma ocasião favorável para lembrar também de forma emocionada os grandes Bispos do Porto do século XX e nesta transição para o XXI: António Barbosa Leão (de 1919 a 1929); António Augusto de Castro Meireles (de 1929 a 1942)); Agostinho de Jesus e Sousa (de 1942 a 1952); António Ferreira Gomes (de 1952 a 1982); Júlio Tavares Rebimbas (de 1982 a 1997). Não se esqueça o administrador apostólico, que o foi de 1959 a 1969, Florentino de Andrade e Silva, de um forte sentido pastoral que o levou à criação de novas paróquias no espaço citadino. A continuidade neste século lembra-nos Armindo Lopes Coelho (1997 a 2007), Manuel Clemente (de 2007 a 2013 e António Francisco de 2014 a 2017.

Cada um deles teve a sua grandeza e perfila-se a sua memória, menos em estátuas que firmeza das suas almas e no vigor do seu exemplo. Recorde-se a edição de “Os retratos dos Bispos do Porto na coleção do Paço Episcopal”, uma memória e um estímulo.