Fez, no domingo, 151 anos…

Por João Alves Dias

Nesse longínquo 1 de julho de 1867, Portugal fez-se luzeiro de humanismo e exemplo para as nações civilizadas. Por defender o direito à morte? Não. Sim, por defender o direito à vida.

Portugal tornou-se no primeiro Estado do mundo a abolir a pena de morte.
O grande pensador francês, Victor Hugo, logo que teve notícia, felicitou, em carta enviada ao amigo Brito Aranha, o nosso país nestes termos: “A vossa nobre carta faz-me bater o coração. Não; não há povos pequenos. Há pequenos homens, ai de nós! E algumas vezes são esses os que conduzem os grandes povos. Os povos que têm déspotas assemelham-se a leões que tivessem açaimes. Eu amo e glorifico o vosso belo e querido Portugal. Ele é livre; portanto, é grande.
Portugal acaba de abolir a pena de morte. Consumar esse progresso é dar o grande passo da civilização. De hoje em diante, Portugal está à frente da Europa. Vós não haveis cessado de ser, portugueses, navegadores intrépidos. Avante outrora no Oceano, hoje na verdade. Proclamar princípios é mais belo ainda que descobrir mundos. Clamo: Glória a Portugal!”

Este texto de Victor Hugo, que nos honra, diz-nos que não precisamos de ser subservientes ao argumento da autoridade que nos chega do estrangeiro…

A nossa “Lei de Abolição” foi de tal modo significativa para a humanidade que, no dia 15 de abril de 2015, recebeu a distinção de «Marca do Património Europeu». “Esta consagração pretende contribuir para a promoção dos valores da Cidadania Europeia com especial enfoque nos Direitos Humanos, e para a construção de uma identidade baseada nos valores da tolerância e respeito pela vida Humana”.

No passado, o exemplo de Portugal serviu de argumento aos defensores das correntes abolicionistas de então como o caso de um país que, nascido e herdeiro da mesma tradição histórica e cultural de outras regiões da Europa, teve a coragem de abraçar e aplicar uma reforma de grande alcance civilizacional.

Ontem, como hoje, a Carta de Lei de 1867 tem um forte valor simbólico para a Europa, na medida em que encerra em si muitos dos valores e ideais atualmente plasmados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

As gentes do Porto têm razões de sobra para se sentirem ufanas. Com efeito, Sampaio Bruno, grande pensador portuense que a cidade honra com uma rua na «Baixa», lembra o relevante papel desempenhado pelo deputado do círculo de Cedofeita, Aires de Gouveia. Desde 1863, este representante portuense nas Cortes encetara intensa campanha a favor da abolição da pena de morte. Com tudo isto, o nome de António Aires de Gouveia, no dizer de Bruno, fica ligado “ indissoluvelmente à abolição da pena de morte em Portugal, (e) um reflexo desta glória ilumina a terra em que ele nasceu.” Sejamos dignos dos nossos “egrégios avós”!