
A CAUSA DAS COISAS
Por António José da Silva
A política é uma área propícia ao nascimento ou à fabricação de “heróis”, mas nunca se sabe quanto tempo esse estatuto poderá durar para aqueles que o atingiram. A memória dos homens é curta e muitos desses “heróis” são engolidos, justa ou injustamente, pelas voltas e reviravoltas da História. A História regista muitos casos desses, mas hoje justifica-se assinalar particularmente o que aconteceu a Lula da Silva, a quem foi recusado o pedido de “ habeas corpus” para evitar a prisão.
Não foi sem motivo que, há poucos anos ainda, os analistas económicos internacionais colocaram o Brasil na lista das chamadas grandes potências emergentes, mas bastou apenas algum tempo para que o país deixasse de justificar esse estatuto. Tudo por causa de uma doença aparentemente incurável que dá pelo nome de corrupção. que se estende a todo o país e é transversal a todas as classes sociais, a começar pelos políticos.
Até há pouco tempo, Fernando Color de Melo, presidente entre os anos de 1990 e 1992, foi o nome mais sonante de uma lista de políticos brasileiros acusados judicialmente de corrupção. Foi um processo que levaria à sua destituição, ele que havia ganho as primeiras eleições presidenciais realizadas após o fim do regime militar que governara o país durante mais de duas décadas. Color chegou à presidência com apenas 42 anos, envolto num clima de enorme popularidade e esperança, mas não chegou a cumprir metade do seu mandato. As denúncias de corrupção interromperam a sua carreira que se anunciava brilhante, embora tenha conseguido voltar à política mais tarde, depois da revisão do seu processo judicial.
No começo deste século, as acusações de corrupção atingiram dois presidentes, cada um deles com uma história política e pessoal envolta numa auréola de messianismo ou de heroísmo. Falamos de Lula da Silva, um operário sindicalista e de Dilma Russef, uma resistente à ditadura militar. Por alturas da campanha eleitoral de Lula para o seu segundo mandato presidencial, não faltou quem escrevesse que nenhum político, em qualquer outro lugar do mundo, poderia ter saído incólume do lodaçal de corrupção em que o seu nome se envolvera ou fora envolvido pelos seus companheiros de partido. Mas, nessa altura, Lula ainda era uma espécie de Messias para milhões de brasileiros. Certamente por isso, e apesar de todas as acusações que se abatem sobre ele, parece que muitos se recusam a aceitar agora a prisão de quem já foi o seu herói.