O orgulho gera dissensões

Por João Alves Dias

Desconhecer a Bíblia significa perder de vista uma parte decisiva do horizonte onde historicamente nos inscrevemos. (T. Mendonça)”

Meses atrás, o Agrupamento de Escolas do Cerco do Porto escreveu: “A turma do 4º A da EB da Corujeira convidou o avô do Francisco para vir à escola explicar a Torre de Babel”. Durante duas horas, os alunos ouviram falar da evolução da humanidade e seus mitos. E com que atenção o fizeram!

Diz a antropologia que a ontogénese – evolução do indivíduo humano – segue de perto os passos da filogénese – evolução da espécie humana.

O «Homem Moderno» apareceu há uns duzentos mil anos. Dez mil anos antes de Cristo, nasceu a agricultura, no “Crescente Fértil”. Aí, se construíram as pirâmides (Egito) e os zigurates (Mesopotâmia); inventou-se a escrita; iniciou-se a matemática e a astronomia. Foi o berço da nossa civilização.

Foi também nesta região que o homem, recorrendo a seres sobrenaturais, começou a procurar, nos tempos originais, a explicação para os fenómenos que observava. Surgiram, assim, os “mitos das origens”. O primeiro registo escrito, encontramo-lo na literatura suméria, no “Poema de Gilgamesh”, escrito cerca de 2000 anos a.C. Também o Génesis (Origem), o primeiro livro da Bíblia, começa: “No princípio, Deus criou o céu e a terra…”(Gn 1,1)

É neste contexto que se enquadra a narrativa da Torre de Babel (Gn 11,1).

A seguir ao dilúvio, “Deus abençoou Noé e seus filhos, dizendo: «Sede fecundos, multiplicai-vos e enchei a terra» (11,1)”. Mas, “alguns homens encontraram uma planície onde se estabeleceram”. E, contrariando a vontade divina, fecharam-se no seu orgulho. “E disseram uns aos outros: façamos para s uma cidade e uma torre cujo cimo atinja os céus. Tornemos assim célebre o nosso nome, para que não sejamos dispersos sobre toda a face da terra”. E Deus que antes os abençoara, castigou-os pela sua arrogância: “O Senhor confundiu a linguagem de todos os habitantes, e dali os dispersou sobre a face de toda a terra” (Gn 11,9).

Na cultura judaica, os males da humanidade são castigos de Deus motivados pelo pecado dos homens. Já assim acontecera com a expulsão de Adão e Eva do paraíso (cf. Gn 3,23). Agora, a transgressão provocou a confusão das línguas.

No Prefácio ao livro «Retratos de um Porto sentido», escrito por moradores de S. Nicolau, o professor José Manuel Tedim disse “Ontem éramos apenas nós, todos nos entendíamos. Hoje somos tantos, de tantos Mundos e tantas línguas e culturas onde, afinal, todos nos entendemos”. O que trouxe as dissensões não foi a diversidade de línguas mas a dispersão de egoísmos. Estes é que estão na origem dos muros e das guerras.

Esta região do Médio Oriente foi disputada por todos os grandes impérios de antanho desde o egípcio ao otomano, passando pelo assírio, babilónio, medo, persa, grego, romano e muçulmano. E, ainda hoje, é a maior ameaça à paz mundial: Iraque, Síria, Israel, Irão…