Mensagem (77): Solidões

Nem o sol da manhã é capaz de iluminar as nossas cidades tristes: nos centros históricos, as janelas continuam fechadas, as luzes apagadas e a vida ausente. O Terreiro da Sé e a ponte de D. Luís não parecem os mesmos: nus de pessoas, afiguram-se irreais. O Douro anda estranho e mais parece um lago do que um rio cuja vocação é correr para o mar. E o que mais choca é um silêncio que agride: não se ouvem rumores que não sejam as sirenes das ambulâncias.

No meio desta e muitas outras imagens semelhantes, uma me impressionou: na Florença dos Medici, nessa capital mundial da beleza, uma raposa a passear-se numa avenida deserta, não longe da Catedral de Santa Maria del Fiore. Como quem demarca território: “Se não se veem humanos na cidade, então a selva pode tomar conta dela”.

Tudo isto me traz à mente a situação dos «confinados». Penso em todos e nos seus dramas. Especialmente nos presos e nos utentes dos lares da terceira idade. Os primeiros, mesmo estando com muitos outros, na prática, estão sós. E sofrem um amargo isolamento. Será que, ao menos, nós estamos com eles? Os segundos, regam continuamente as raízes familiares, na esperança de que as mesmas não sequem. Mas, para alguns –para bastantes…- os filhos e os netos estão mais interessados no esquecimento do que propriamente no ressurgir de qualquer rebento de vida.

Sim, há pais e avós «arrumados» nas estruturas de acolhimento que não recebem uma visita ao longo do mês inteiro! Nem sequer um telefonema! E até há os que pedem a uma funcionária para estabelecer uma ligação com os filhos e, não obstante as múltiplas tentativas, só encontram o silêncio da outra parte.

Curiosamente, são estes quem, neste tempo de dificuldades multiplicadas para os lares, vão para as redes sociais criticar, dizer mal, dar pseudossoluções e mostrar uma preocupação que nunca tiveram. São gente sem coração e sem sentimentos que se engana a si própria julgando que engana os outros. Precisam de ser desmascarados. E que alguém ouse dizer-lhes: “A energia que gastas nisso seria mais bem empregue se, ao menos, telefonasses à tua mãe”.

Neste tempo pascal, lembro-me da cena dos dois discípulos de Emaús. No caminho, eles iam solitários e deprimidos. Mas o Ressuscitado fez estrada com eles. E o coração começou-lhes a “arder” de júbilo e contentamento.

Seja Ele quem retira a solidão dos solitários.

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